Salvatore Cernuzio – Vatican News
O Papa e a Santa Sé estão próximos do sofrimento de todos: não se foi “superficial” na condenação do terrível ataque do Hamas em 7 de outubro; ao mesmo tempo, não se pode “ignorar” o que está acontecendo em Gaza, “onde houve tantos mortos, tantos feridos, tanta destruição”. É o cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado do Vaticano, que reitera aquele princípio de “equiproximidade” que sempre foi o estilo da Santa Sé desde a época de Bento XV, que também foi “atacado por ambos os lados” durante a Primeira Guerra Mundial por ter mantido “uma posição de neutralidade”, não reconhecendo – segundo os acusadores – “o agressor e o agredido”. Um destino que agora também parece afetar o Papa Francisco, cujas palavras no final da audiência geral desta quarta-feira (22) suscitaram a polêmica de alguns representantes do mundo judaico, incluindo na manhã desta quinta-feira os Rabinos da Itália, que em uma nota lamentaram que o fato de que o Pontífice teria colocado o Hamas e Israel no mesmo nível ao falar de “terrorismo” de ambos os lados.
Questionado sobre isso por jornalistas do lado de fora da Basílica de Santo André della Valle, no centro de Roma, onde à tarde celebrou a Missa pelo 90º aniversário do Holodomor, o dramático extermínio por fome de milhões de ucranianos em 1932-33, o secretário de Estado falou de acusações que “não fazem sentido” contra o Papa e enfatizou que os recentes eventos “certamente” não colocam em questão as relações com o mundo judaico e “as conquistas desses anos, a partir da Nostra Aetate“. Pelo contrário, “estamos profundamente preocupados com essa onda de antissemitismo que está sendo desencadeada em todos os lugares”.
De acordo com Parolin, “por parte da Santa Sé, houve uma postura muito clara em relação ao ataque do Hamas, não fomos superficiais”. Foi ele mesmo, à margem de um evento na Gregoriana, após o ataque de milicianos em Israel, que falou de um ataque “terrível” e “desprezível”. Depois, o Papa, que em todos os pronunciamentos públicos nunca deixou de estigmatizar a violência e pedir um cessar-fogo e a libertação dos reféns israelenses.
“Parece-me que a Santa Sé tenta de todas as formas ser justa, levar em conta o sofrimento de todos. Mesmo este caso, terrível que Israel sofreu, deve ser condenado”, ressaltou o cardeal. Ao mesmo tempo, “também não podemos ignorar o que está acontecendo do outro lado”, ou seja, na Faixa de Gaza, “onde houve tantos mortos, tantos feridos, tanta destruição”. “O Papa – acrescentou o cardeal, lembrando o comunicado que anunciava a audiência desta quarta-feira com as famílias dos reféns e um grupo de palestinos – quer estar próximo do sofrimento de todos aqueles que estão sofrendo”.
Aos repórteres que apontaram que a crítica esta quinta-feira dos Rabinos é semelhante àquela que foi feita em relação à guerra entre a Ucrânia e a Rússia, por uma suposta falta na distinção entre “agressores” e “atacados”, Parolin respondeu: “Nós já respondemos, na ocasião. O Papa e a Santa Sé afirmam isso claramente: no caso da Ucrânia, dissemos que “é uma guerra de agressão…”. Mais do que isso, o que mais podemos dizer? É preciso também ler as palavras com atenção e entender o que elas significam. Então, se alguém quiser mais, nós também temos nossa posição, fazemos nossas considerações, tomamos nossas decisões”. “Não me parece, entretanto – assegurou o purpurado – que haja uma equivalência. Absolutamente. O que precisa ser dito nós sempre dissemos, ainda que nas formas consoantes à Santa Sé”. E “o que o Papa diz, ele diz claramente. É claro que não da maneira como querem”.
Tensões, acusações e dificuldades em falar sobre a paz não são, de forma alguma, uma novidade. “Não é a primeira vez que isso acontece… Se se lembram, durante a Primeira Guerra Mundial, o Papa Bento XV foi atacado por ambos os lados porque ele também, dizia-se, tinha uma posição de neutralidade, não reconhecia o agressor e o agredido…”, recordou Parolin. “Portanto, sinto muito, mas não estou surpreso. É o destino poder dizer a cada um o que precisa ser dito, mas, volto a dizê-lo, da maneira como a Santa Sé o faz.”
Com relação aos canais de diálogo que a Santa Sé está buscando no Oriente Médio, o secretário de Estado explicou que “o que pode ser feito é continuar com a questão dos reféns. No momento, não há muitas outras possibilidades”. O gesto do Papa de receber as famílias no Vaticano, de acordo com o cardeal, “pode servir, nesse sentido, para ajudar a solucionar o problema”.
Enquanto isso, o trabalho na questão ucraniana para o retorno das crianças levadas à força para a Rússia não cessa. “O mecanismo está ativo, ou seja, o mecanismo criado após a visita do cardeal Zuppi a Moscou e a Kiev. E está dando alguns resultados”. No entanto, esclareceu Parolin, “também aqui não se deve esperar resultados retumbantes de que centenas e centenas sejam libertadas…”. Números sobre os quais, ademais, “não há consenso: um lado diz uma coisa, outro lado diz outra coisa. Mas há um trabalho sendo feito e ele produziu alguns frutos”.
Uma pergunta ao cardeal também sobre as declarações do presidente russo Vladimir Putin no G20 de que a Rússia está “pronta para conversações” para acabar com a “tragédia” da guerra na Ucrânia. Putin é confiável ao auspiciar o fim do conflito que ele mesmo iniciou? “Espero que ele seja confiável porque é isso que todos nós esperamos”, ponderou Parolin. Ao mesmo tempo, ele expressou preocupação com o adiamento do acordo entre o Hamas e Israel para uma trégua temporária e a libertação de reféns israelenses e prisioneiros palestinos. Na quarta-feira, sobre o assunto, o cardeal comentou que foi “um passo importante” que acendeu lampejos de esperança. Esta quinta, ao invés, a amarga constatação: “Isso não é um bom sinal”, observou, “mas me disseram que o último passo era o Tribunal ou a Suprema Corte dar o aval, não sei se essa foi a razão pela qual não houve o acordo… Esperamos realmente que se possa chegar a um entendimento, pelo menos a um cessar-fogo”.
Fonte: Vatican News